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Invoice Gates, Kash Patel e por que o Ocidente adora dizer ‘Jai Shri Krishna’

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Foi o tipo de momento televisivo que não se anuncia como histórico, mas que perdura mesmo assim. De um lado da tela, Tulsi Virani – a robusta matriarca do melodrama indiano do horário nobre – ofereceu sua saudação de mãos postas, sua marca registrada. Do outro lado, transmitido de todo o mundo, Invoice Gates, cofundador da Microsoft e filantropo world, sorriu e repetiu as suas palavras: “Jai Shri Krishna”.A cena, parte de uma aparição especial em Kyunki Saas Bhi Kabhi Bahu Thi 2pretendia sinalizar boa vontade. Talvez um aceno ao amplo apelo do programa, talvez um gesto de diplomacia cultural. Mas o que mais se destacou não foi a presença de Gates, mas sim sua fluência. Aquela frase de três palavras em sânscrito, pronunciada sem hesitação, pareceu ao mesmo tempo surpreendente e inteiramente plausível.Poucos meses antes, Kash Patel – antigo chefe de gabinete do Pentágono e nomeado para Diretor do FBI – abriu a sua audiência no Senado dos EUA dizendo a mesma frase. Com seus pais sentados atrás dele, Patel tocou seus pés e se dirigiu à sala em inglês antes de acrescentar: “Jai Shri Krishna”. Nenhuma tradução foi seguida. Nada foi necessário.Em ambos os casos, a frase não veio com explicação. Simplesmente pairava no ar, como se seu significado já tivesse viajado à frente das próprias palavras. O Ocidente, ao que parecia, tinha começado a compreender.

O escolhido do chefe do FBI, Kash Patel, cumprimenta ‘Jai Shri Krishna’ para seus pais na audiência do Senado e se torna viral

Bhakti em uma passagem só de ida

A história de como o nome de Krishna se tornou reconhecível no Ocidente geralmente começa com uma viagem. Em 1965, um monge de 69 anos chamado AC Bhaktivedanta Swami Prabhupada deixou Calcutá a bordo de um navio cargueiro com destino a Nova York. Ele chegou com pouco dinheiro, um caixote de escrituras traduzidas e a convicção de que a mensagem da consciência de Krishna – bhakti, ou devoção amorosa a Deus – poderia criar raízes no Ocidente.A princípio, period uma proposta improvável. A América de meados dos anos 60 period culturalmente instável: agitação urbana, revoltas pelos direitos civis, protestos no Vietname. Mas period também um lugar de inquietação espiritual. Quando Prabhupada começou a liderar cantos públicos no Tompkins Sq. Park e a dar palestras numa pequena loja do East Village, jovens americanos curiosos – alguns desiludidos, outros simplesmente curiosos – começaram a reunir-se.Ele fundou a Sociedade Internacional para a Consciência de Krishna (ISKCON) em 1966. O que se seguiu não foi uma conversão em massa, mas uma espécie de absorção. O movimento alinhou-se com a contracultura sem se render totalmente a ela. Os seguidores ocidentais rasparam a cabeça, usaram túnicas cor de açafrão e cumprimentaram estranhos com “Hare Krishna”. Foi um movimento definido pela música, pela repetição e por uma certeza tranquila de que a alegria – tanto espiritual como comunitária – poderia ser revolucionária.

George HarrisonPresente

Ravi Shankar ensina George Harrison a tocar cítara 1968 (Rishikesh, Índia HQ RARE)

Nenhum movimento cultural se consolida na consciência ocidental sem a ajuda da corrente dominante. No caso da ISKCON, chegou na forma de um Beatle.George Harrison, já atraído pela música e filosofia indianas, tornou-se um dos patronos mais visíveis do movimento. Ele ajudou a financiar o primeiro templo da ISKCON em Londres e produziu uma gravação do mantra Hare Krishna que se tornou um pequeno sucesso nas rádios britânicas. Mais tarde, seu próprio single My Candy Lord combinou gospel com cantos sânscritos, trazendo o nome de Krishna ao topo das paradas na Europa e nos Estados Unidos.Harrison também doou Bhaktivedanta Manor, uma propriedade nos arredores de Londres que continua sendo um importante centro da ISKCON até hoje. E foi através dele que muitos encontraram Krishna pela primeira vez, não através das escrituras ou da teologia, mas através da melodia. Os mantras não exigiam crença para serem cantados. E na cantoria algo mudou.Mesmo assim, o movimento permaneceu, aos olhos do público, uma curiosidade. Devotos vestidos de açafrão dançavam nos aeroportos e ofereciam comida grátis nos campi universitários. O nome de Krishna foi ouvido com mais frequência na cultura pop. No entanto, apesar de tudo, a frase “Jai Shri Krishna” permaneceu silenciosamente, falada menos em público, mas enraizada em casas e templos particulares. As bases para a sua visibilidade futura estavam sendo lançadas.

George Harrison – Meu Doce Senhor

Instituição vira infraestrutura

Na década de 1980, a energia do movimento inicial havia se estabilizado. A ISKCON enfrentou os desafios comuns a muitas instituições religiosas: mudanças de liderança, escrutínio interno e o lento abandono da novidade pública. Mas mesmo com as manchetes desaparecendo, o trabalho continuou. Templos foram construídos. As fazendas eram administradas. Os programas de ajuda alimentar serviram comunidades em todos os continentes.Entretanto, a diáspora indiana cresceu – e com ela, um tipo diferente de visibilidade devocional. Os índios americanos e os indianos britânicos de segunda geração começaram a afirmar suas identidades com menos hesitação. “Jai Shri Krishna” foi ouvido em casamentos, eventos comunitários e celebrações de feriados. Tornou-se parte do ritmo da vida diaspórica.Este não foi o espetáculo dos cantos de rua. Period mais silencioso, inserido no cotidiano. Krishna mudou-se de parques públicos para casas suburbanas, e seu nome tornou-se parte da trilha sonora doméstica. A saudação de uma avó, uma mensagem de texto, um recital de criança no templo. A frase viajou, não pelas instituições, mas pela memória.

Fluência Secular e Confiança da Diáspora

No início dos anos 2000, Krishna já não period mais desconhecido. Os estúdios de ioga encerraram as sessões com cânticos em sânscrito. Os aplicativos de mindfulness incluíam versos do Gita. Música pop com amostras de mantras. O vocabulário da espiritualidade indiana tinha entrado na corrente dominante world — muitas vezes simplificado, mas raramente ridicularizado.Ao mesmo tempo, a visibilidade política da diáspora indiana começou a aumentar. Líderes como Rishi Sunak, Kamala Harris e Tulsi Gabbard representavam diferentes vertentes ideológicas, mas carregavam consigo uma certa textura cultural. O Diwali agora period celebrado em Downing Avenue e na Casa Branca. Os versos do Bhagavad Gita foram citados em debates legislativos americanos. Os rituais públicos não estavam mais ocultos. Eles foram encenados.Neste contexto, a aparição informal de “Jai Shri Krishna” – seja de um magnata da tecnologia ou de um candidato político – já não parecia novidade. A invocação de Gates pode ter sido escrita, mas aconteceu porque period legível. A saudação de Patel pode ter sido pessoal, mas não precisava de explicação. A frase tornou-se parte da gramática pública da pertença à diáspora.

Não apenas uma saudação

“Jai Shri Krishna” é mais do que uma saudação. É um gesto, um sinal e um pequeno pedaço de liturgia. Nomeia um deus, certamente, mas também nomeia uma tradição – de diversão, sabedoria e intimidade com o divino. É o tipo de frase que não precisa convencer para ressoar.Ao contrário das declarações doutrinárias, não pede nada em troca. Pode ser falado por crença, hábito, orgulho ou afeição. E viaja bem. Entre idosos e crianças. Entre amigos em fusos horários diferentes. Entre estranhos que reconhecem a cadência antes de compreenderem as palavras.A sua entrada na vida pública não aconteceu porque alguém a planejou. Aconteceu porque as pessoas o carregavam – às vezes conscientemente, às vezes não.

Do Murmúrio Devocional ao Eco Cultural

A frase “Jai Shri Krishna” não chegou ao Ocidente com Gates ou Patel. Nem se espalhou apenas através do impulso de um movimento ou de uma comunidade. Seu caminho tem sido irregular, moldado tanto pelo acidente quanto pela intenção. Em parte através das músicas de um Beatle. Em parte através dos ensinamentos de um monge. Em parte através dos recitais da escola dominical dos templos suburbanos. E em parte pela persistência da memória entre aqueles que migraram mas não esqueceram.O seu reconhecimento precise deve-se menos a qualquer esforço concertado do que a décadas de repetição silenciosa. O ritual tornou-se rotina. O que antes period sussurrado nos pátios agora aparece ocasionalmente nos registros públicos. Estas aparências não devem ser exageradas. Um bilionário da tecnologia repetindo uma frase em sânscrito ou um candidato ao Senado invocando Krishna não marca uma transformação religiosa. Sinaliza algo mais sutil – que o nome de Krishna não mais assusta, que sua presença na linguagem pública não requer mais justificativa. O Ocidente não adotou Krishna. Mas aprendeu, aos poucos, a dividir espaço com ele. Na longa história da expressão religiosa, isso por si só marca uma mudança digna de nota.



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